De osso ou aço?

Cada vez mais as máquinas substituem o trabalho do homem. Gradativamente deixamos que computadores façam atividades que poderíamos fazer, mas em prol do conforto abdicamos da possibilidade. Cada vez mais viramos parasitas dentro das nossas casas... Essas e outras constatações e suposições relacionadas à robotização, relação homem versus máquina, perda da subjetividade, etc. rondaram minha sexta-feira. E grande parte desta temática eu pude assistir na peça “E.V.A. – Um monólogo”, com a direção de Janailton Santos e a atuação de Ediane Karlesia, no Teatro Arthur Azevedo aqui em São Luís, e também no filme "Wall-e".

Em relação à peça: ela essencialmente foca nas múltiplas relações feitas entre teatro, a linguagem corporal da dança, sons, imagens e vídeos. A atriz faz diversos elos entre a Bíblia – devido ao nome EVA representar a personagem feminina considerada uma das primeiras habitantes da Terra, de acordo com o livro – e a atual gênese decadente de conceitos, ações, valores. Percebemos isto na comparação feita entre as imagens, em um determinado momento: enquanto um telão mostrava um espermatozóide fecundando um óvulo – a natural maneira de geração de um indivíduo -, em outras telas, cenas de um filme distorciam a ideia mostrando um bebê gerado de forma artificial, conectado por cabos de aço.

Enquanto a atriz se expressava com palavras e gestos, uma série de outras imagens significativas e inquietantes passava pelas telas no palco. Desde cenas do seriado Aeon Flux e do filme Matrix, até imagens de explosões, navalhas cortando córneas e outras coisas assim, digamos, agoniantes, tinham o objetivo de fazer uma ponte com o espetáculo e a nossa subjetividade, o nosso inconsciente. Uma forma de incentivar nossa abstração e fazer com que a peça de complicada passasse a ser decodificável, ou com pontos de identificação conosco.

Algo parecido vi no filme Wall-e (foto), onde um robozinho responsável pela limpeza da Terra, lá pelos idos de 2800 e tantos, é o protagonista de uma história onde humanos vivem em cruzeiros espaciais por não poderem mais viver na Terra. São seres humanos preguiçosos, gordos, inertes. Verdadeiros vegetais. Isso tudo por qual motivo? Por deixarem que robôs façam tudo por eles, enquanto a terra é povoada apenas por um pequeno robô que a cada dia faz pilhas e pilhas de lixo compactado. Apesar de puxar o assunto da proteção ao nosso planeta, Wall-e também comenta bastante sobre a dominação da máquina sobre o homem. Percebemos isso muito bem quando um “motim”, como um dos personagens diz, é formado pelas máquinas a fim de evitar a volta dos humanos balofos à Terra. O filme também traz uma série de detalhes capazes de mexer com nossa subjetividade, fazendo elos com a Bíblia em diversos momentos, tanto sobre a história da criação do homem (sim, há uma Eva em Wall-e!) quanto à passagem sobre a arca de Noé.

Poderia muito bem dizer pra vocês que "fica a dica", mas antes de mais nada sugiro que não deixem que uma peça ou filme, somente eles, lhes incentivem. Não esperem algo mais para ter consciência do que e como estamos vivendo.

Até!

2 comentários:

  1. Não vi a peça nem o filme, mas gostei muito do seu texto. A robotização dá margem para muitas discussões. É sempre um bom tema para refletir.

    Valeu!

    Tiago França

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  2. Muito bom o texto.
    Concordo com o último parágrafo,
    a iniciativa precisa vir da própria reflexão
    e não tão somente do incentivo de um filme ou peça!

    Bom trabalho!

    inté

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